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Um Dia com Jerusa (2020 – Netflix)

Duas almas femininas que compartilham suas ancestralidades.

Recentemente, nos deparamos com a partida da querida atriz Léa Garcia durante a sua estada em Gramado para o recebimento de uma merecida homenagem pelos seus trabalhos realizados na tv, no teatro e no cinema. O filme que destacamos aqui, neste artigo, é apenas uma mostra do seu grande talento e rara sensibilidade na construção de um papel feito sob medida para a sua brilhante atuação.

O longa metragem “Um Dia com Jerusa” (com roteiro e direção de Viviane Ferreira) nos apresenta a história de Silvia Ferreira (interpretada por Débora Marçal), uma jovem sensitiva que trabalha, no bairro do Bixiga em São Paulo, realizando pesquisas junto a consumidores para uma marca de sabão em pó, enquanto aguarda o resultado de um concurso público.

Ao bater na porta de Jerusa Anunciação (interpretada com grande sensibilidade pela atriz Léa Garcia), a jovem pesquisadora é logo surpreendida com algumas respostas nada convencionais e com um diálogo que a leva a compreender a vida de uma outra maneira que está acostumada a viver em seu cotidiano (menos veloz e menos quantitativa).

Premiação de Melhor Filme na Mostra de Cinema de Caruaru

“Um Dia com Jerusa” surgiu a partir de um curta metragem homônimo de 2014 e chegou a receber o prêmio de “Melhor Filme” na Mostra de Cinema de Caruaru, fazendo com que a sua diretora, Viviane Ferreira, se tornasse a segunda mulher negra a dirigir um filme de ficção individualmente no Brasil.

Além disso, o filme também obteve, entre outras premiações importantes, a indicação no AMAA – Africa Movie Academy Awards, na Nigéria.

Um filme cheio de simbolismo e que marca o talento de Léa Garcia nas telas.

Durante o encontro das duas, Jerusa (uma gentil senhora de 77 anos) vai compartilhando as suas memórias e experiências de vida, fazendo com que nós transitemos, como espectadores, por tempos e realidades comuns às suas ancestralidades. O simbolismo das imagens fotográficas (imaginárias/imaginativas ou não) também nos remetem a própria ideia de uma mulher negra que documenta não apenas a história dos seus familiares, mas do seu tempo (à sua maneira). Identidade negra e sexualidade são alguns temas abordados no filme com extrema simplicidade e leveza, a medida em que somos conduzidos pela narrativa de Jerusa.

Foi nas margens do rio Saracura que um dos maiores quilombos urbanos existiu (o “Quilombo de Saracura”). Nesse mesmo território, que posteriormente ganhou status de bairro italiano e, até recentemente, de bairro “cool”, que Silvia vai sentindo as impressões ancestrais em seu próprio corpo (através de relatos com os quais jamais pensou em se conectar), começando a entender que estamos todas conectadas (seja por detrás das câmeras, na frente delas ou nas cadeiras das melhores faculdades do país).

Por muitos e justos motivos, “Um Dia com Jerusa” se transforma em um filme histórico. Pelas suas histórias contatas de uma maneira leve e cativante, pelo debate central sobre o papel da mulher negra (assim como as relações geracionais entre nós) e por ser mais uma vez um trabalho magistral de uma atriz que abriu muitas portas para o surgimento de outras atrizes que hoje estão ocupando o seu espaço, como protagonistas, em obras como a que está sendo exibida no streaming da Netflix. Vale a pena conferir!